Wednesday, May 23, 2007

A escola que é um manifesto contra o "eduquês"

23.05.2007

É privada, escolhe os professores, recebe todos os alunos do concelho, dos pobres aos ricos, ensina a tabuada, tem quadro de honra, não vai em modas. Fica em Arruda dos Vinhos e perceber como lá se ensina desfaz muitos mitos sobre como deve ser o sistema de ensino

Fica em Arruda dos Vinhos, concelho rural dos arredores de Lisboa. É a única escola desse concelho que tem terceiro ciclo do ensino básico e, por esse concelho ter sido o único onde a média a Matemática nos exames nacionais do 9º ano foi positiva, o PÚBLICO visitou a João Alberto Faria. A reportagem foi publicada segunda-feira, mas vale a pena voltar ao tema.

Porque essa escola é um manifesto vivo contra o tipo de políticas que têm degradado a qualidade do ensino em Portugal.

Primeiro: naquela escola entende-se, e citamos, que "a massificação do ensino levou a um menor grau de exigência, mas a Matemática não se tornou mais fácil e mantém as dificuldades próprias da disciplina"- o que requer "esforço e trabalho".

Segundo: naquela escola não se embarca em modas, prefere-se cultivar a exigência. Por isso "o grupo de Matemática é pouco atreito a algumas inovações pedagógicas", por isso defende-se que "saber a tabuada é mais importante do que saber utilizar a calculadora", por isso interditaram mesmo a sua utilização no 2º ciclo.

Terceiro: como sem bons professores não há boas escolas, na Alberto Faria todos os professores são entrevistados antes de serem contratados, explicando-se-lhes qual a filosofia da escola e avaliando se os candidatos estão à altura do que se lhes vai pedir.

Quarto: não há nenhuma relação inelutável entre os bons resultados de uma escola e o nível sócio-económico da região onde se insere. Arruda dos Vinhos está longe de ser um dos concelhos com mais poder de compra e na João Alberto Faria não se seleccionam os alunos, recebem-se todos, mais ricos ou mais pobres.

Mais: recebem-se também alunos de concelhos vizinhos, porque, como explicou um aluno do 10º ano que quer ir para Medicina, nela "o nível de exigência dos professores pode ser compensado pelos resultados nos exames, que normalmente tendem a ser melhores". Quem responde bem à exigência possui também o estímulo de figurar no Quadro de Honra da escola.

Quinto: uma direcção escolar focada em disciplinas como Matemática ou Português levou a que o tempo lectivo destinado ao Estudo Acompanhado fosse dedicado só a essas disciplinas.

E quando acabam as aulas do 9.º ano os docentes estão disponíveis para dar aulas extra de preparação para os exames de Português e Matemática e ainda todas as que sentirem necessárias para o esclarecimento de dúvidas dos seus alunos.

Tudo o que atrás fica escrito permite que os bons resultados daquela escola se prolonguem no ensino secundário, tendo o ano passado ficado em 32º lugar nos rankings feitos a partir dos resultados a Matemática dos seus alunos no 12º ano. Uma boa posição, se nos lembrarmos que falamos de uma escola que não foi feita para alunos de elite.

Contudo, para o quadro ser completo, é necessário sublinhar outra: esta é uma escola privada. O seu nome completo é Externato João Alberto Faria. Mas os seus alunos não pagam para a frequentarem, pois, como é a única do concelho, tem um contrato de associação com o ministério.

Estes contratos de associação são relativamente raros no país, havendo mesmo assim quem defenda que o Estado devia construir escolas públicas ao lado de estabelecimentos privados como este. Mesmo que tal saísse muito mais caro. E resultasse numa menor qualidade de ensino. Só que a Alberto Faria mostra como fazer o contrário pode resultar muito melhor.

Conclusões? Que se as escolas escolhessem os professores, se os alunos escolhessem as escolas, se o Estado se limitasse a dar orientações gerais, em vez de dirigir, e desse um cheque-ensino aos alunos menos abonados que quisessem ir para uma escola mais exigente, ou melhor, privada e paga, ganharia a qualidade de ensino e o ministro das Finanças agradeceria. Só os interesses instalados se revoltariam.

José Manuel Fernandes

Wednesday, May 16, 2007

Sócrates professor independente

Do Público de hoje:

José Sócrates foi professor da Universidade Independente, apesar de a lei o proibir
16.05.2007 - 09h11 José António Cerejo, PÚBLICO

O ex-secretário de Estado do Ambiente José Sócrates foi "professor convidado" da Universidade Independente em 1996-1997, logo após a conclusão da sua licenciatura naquele estabelecimento.

A lei então em vigor proibia os membros do Governo de exercer quaisquer outras "funções profissionais, remuneradas ou não". A contratação de Sócrates, conforme consta da lista dos professores da UnI publicada no Diário da República pelo Ministério da Educação, foi feita mediante um "acordo de colaboração".

Na entrevista em que, no mês passado, tentou esclarecer o seu percurso académico, o primeiro-ministro quis antecipar novas polémicas, referindo-se, por iniciativa própria, à sua colaboração com a UnI.

Segundo explicou, o reitor convidou-o "para dar aulas" logo após a sua licenciatura. "E eu estava tentado a aceitar. Achava honroso o convite. Depois descobri que não podia dar aulas porque estava impedido por lei", contou, adiantando que havia uma "expressa incompatibilidade de funções entre membros do Governo e qualquer actividade regular de dar aulas".

Desconsolado com facto de não poder aceitar, o recém-licenciado encontrou a solução que revelou na entrevista: "O que acabei por fazer foi dar uma série de seminários a alunos da cadeira de Ambiente, alunos [que] salvo erro eram do curso de Engenharia Florestal, como forma de ser gentil e atencioso com a UnI."

A alternativa simpática descoberta por Sócrates pecava, porém, por um problema: era igualmente incompatível com as suas funções governamentais. Isto porque a lei não permite qualquer distinção entre a "actividade regular de dar aulas" e "dar uma série de seminários".

Expressamente, o que a Lei n.º 64/ 93, com as alterações de 1994, 1995 e 1996, dizia era tão simples quanto isto: "A titularidade dos cargos a que se refere o número anterior [incluindo os de membro do Governo] é incompatível com quaisquer outras funções profissionais, remuneradas ou não."

E as excepções abertas pela mesma lei para "as actividades de docência no ensino superior" não remuneradas, bem como as que constavam de um outro diploma de 1996 para "a realização de conferências e palestras" remuneradas, aplicavam-se apenas aos "titulares de altos cargos públicos" descritos nessas leis, não se aplicando aos membros do Governo.

A esta questão da violação da lei das incompatibilidades acresce o facto de, a fazer fé no Departamento do Ensino Superior do Ministério da Educação, a actividade exercida por Sócrates na UnI ter sido mesmo a de "professor convidado".

Publicada por imperativo legal em 17/10/1997, a "listagem do pessoal docente" daquela universidade incluía, em 31/12/1996, o licenciado José Sócrates Sousa, com a categoria de "professor convidado" e sujeito ao regime contratual do "acordo de colaboração".

As restantes colunas do mapa não indicam o número de horas semanais de aulas leccionadas e têm em branco o espaço destinado a anotar se o professor tem actividade docente.

O PÚBLICO não conseguiu esclarecer, junto da UnI e do gabinete do primeiro-ministro, qual a natureza do "acordo de colaboração" em causa, nem qual a remuneração que lhe correspondia. Colocado perante a lei das incompatibilidades e as contradições existentes entre o que Sócrates disse o que consta do Diário da República, o gabinete do primeiro-ministro reagiu assim: "Nada a responder".

Sunday, May 6, 2007

Bernard-Henri Lévy On America

A marca BHL

A sua fama, naturalmente, precede-o. Pelas melhores e pelas piores razões. A sua obra de ensaísta, divulgador e jornalista é vasta, toca temas de grande actualidade numa escrita poderosa. Material de "best-seller". Em contrapartida, o estatuto de "estrela intelectual" irrita. Compôs uma figura - são famosas as suas camisas brancas de colarinho aberto. Cultiva um estilo que convém aos tempos hipermediatizados em que vivemos. Criou uma marca: Bernard-Henri Lévy já é apenas BHL. Um caso que talvez só seja possível num país onde os intelectuais têm um lugar à parte.

BHL escreve nos jornais, é omnipresente nas televisões, desloca-se pelo mundo, interpela os poderes em nome das suas causas, aliás, todas louváveis. A sua profissão: militante dos direitos humanos e combatente dos totalitarismos. Mais do que filósofo, embora tenha estudado filosofia na prestigiada École Normal Supérieur, discípulo de Althusser e de Derrida. O seu nome está ligado ao movimento dos Novos Filósofos, nascido em França em 1976. Ele e os seus amigos, como André Glucksmann, vinham da extrema-esquerda e denunciavam o compromisso da esquerda francesa com o Gulag soviético.

Os media adoram-no e percebe-se porquê: cada resposta sugere um título, mesmo que às vezes nos deixe em suspenso, à espera de mais. Os académicos acusando-o de superficialidade. Com
algum desdém, alguns jornalistas dizem que os seus livros de reportagem são "romanquêtes". Por exemplo, aquele que escreveu em 2003 sobre Daniel Pearl, repórter do "Wall Street Journal", raptado e decapitado no Paquistão por um ramo da Al Qaeda ("Qui a tué Daniel Pearl"). A verdade é que o seu método é eficaz: vai lá sempre, aos locais onde se encontra a barbárie, seja a destruição de Sarajevo ou a limpeza étnica no Kosovo.

A sua última grande aventura foi em Darfur. Entusiasma-se quando discutimos a questão já com o gravador desligado. Conta como entrou clandestinamente, ignorando as autoridades de Cartum, o único jornalista ocidental a fazê-lo nos últimos tempos. É esta hoje a sua grande batalha contra a indiferença. Nisso, é absolutamente consequente.

Politicamente, declara-se de esquerda, embora de uma esquerda rara em França. Gosta da América como se verá nesta entrevista, é pró-israelita e mais ou menos liberal. Três pecados imperdoáveis. Vota Ségolène. TdeS

Temos a cabeça cheia de clichés sobre a América e são todos falsos
Teresa de Sousa
Fomos encontrá-lo num hotel de luxo, em Lisboa, onde passou três dias disponível para a imprensa portuguesa. A editora Asa acaba de publicar o seu livro mais recente, "American Vertigo", resultado de um longo périplo pelos Estados Unidos a convite da revista "Atlantic Monthly" para seguir as pisadas de Alexis de Tocqueville, o grande sociólogo francês que escreveu, no século XIX, a obra mais emblemática sobre a América - "De la Democratie en Amérique".

A viagem de Bernard-Henri Lévy, aliás, BHL, 173 anos depois do seu compatriota, foi realizada em 2004, em plena campanha para a reeleição de Bush. Por estrada, quase sempre. Este-Oeste, Norte-Sul, ao estilo de Kerouac, sem paragens certas nem horários a cumprir. "Foi a estrada que fez este livro (...), e que inspirou esta obra incompleta de um possível retrato da América".
"American Vertigo" foi publicado primeiro nos EUA, no início de 2006, e mereceu mais críticas do que elogios. A nossa conversa começa por lá e termina, obrigatoriamente, do lado de cá - em França.

Depois da sua longa viagem pela América, mudou as ideias que tinha?

Mudei. Fiz o que muito pouca gente faz: atravessar o país em todos os sentidos por estrada, olhar para tudo, para tentar testar os clichés contra a prova do real. Todos nós temos a cabeça cheia de clichés quando se trata da América. Os anti-americanos têm clichés, os pró-americanos também. Todos os clichés são falsos.

Uma experiência como esta transforma-se numa máquina de quebrar clichés. As minhas ideias mudaram.

Por exemplo?

Pensava que a América era um país imperial. A ideia merece ser revista. Pensava que a América não tinha sistema de saúde e de segurança social. É mais complicado que isso. É diferente do nosso, uma mistura de publico e privado, mas existe. Pensava que a América era um país materialista e é provavelmente o país mais religioso do mundo. Pensava que o Sul eram os Estados da segregação, onde os negros teriam ainda um longo caminho a percorrer para cumprir o programa de Martin Luther King. Descobri que o caminho já tinha sido percorrido no essencial. Cada passo foi uma surpresa.

Esta surpresa confirmou a ideia de que europeus e americanos continuam a pertencer ao mesmo planeta ou viu uma América que diverge cada vez mais de nós?

O que vi e o que discuti com inúmeros intelectuais, de direita e de esquerda, conservadores e democratas, é que há, de facto, uma tentação de largar as amarras da Europa. Mas direi que a questão que acabou de colocar é aquela que se colocam a eles próprios todos os americanos. A questão central é essa...

A relação com a Europa?

O que é que fazemos com a Europa? A Europa é a nossa mãe, mas como é que traduzimos isso nos dias hoje? Como é que resolvemos o nosso complexo de Édipo ou de Electra? Matamos ou não a mãe? É a questão metafísica e, consequentemente, política.

Por que é que se coloca agora? Porque a guerra-fria terminou? Porque o mundo está a mudar?

Porque a guerra-fria acabou. Porque há uma mudança da população americana com a chegada dos hispânicos. E pela proximidade à Ásia através da costa do Pacífico. E também por causa da psicologia dos homens. O complexo de Édipo existe nos humanos como nas colectividades. Nós, na Europa, temos o complexo ao contrário: o ódio da mãe pela filha. Que é o anti-americanismo. Mas, se tivesse de fazer uma aposta, apesar de tudo diria que não haverá ruptura entre a América e a Europa. A presença europeia é demasiado forte, os valores europeus impregnam a sociedade americana de forma profunda e creio que, sem isso, a América seria outra coisa.

Há passagens no seu livro dedicadas a descrever o Presidente americano. Pelo menos inicialmente os europeus não compreendiam essa escolha...

Olhe para o seu país. Uma civilização, um império, uma cultura e ofereceu-se a si próprio durante décadas dois cretinos: Salazar e Caetano. Isso não quer dizer nada. Na França é o mesmo. O que eu creio, realmente, é que George W. Bush é um parêntesis. Temos os olhos fixos em Bush, ficamos completamente obnubilados por ele, como se ele fosse a verdade da América. Ora, não é nada disso.

Mas é essa a América que temos visto, dos "neocons", do fundamentalismo religioso...

Isso quer dizer que não compreendemos nada.

Encontrou Barak Obama em 2004 e diz no seu livro que é preciso prestar-lhe atenção. Hoje todos nós lhe prestamos imensa atenção.

Creio ter sido um dos primeiros europeus a imprimir o nome de Barak Obama e a fazer o seu retrato. Logo que o vi, senti imediatamente que era uma personagem considerável e uma das faces possíveis da América.

Diz que Obama é um negro branco.

O que digo é que a força de Obama reside no facto de não ser um descendente de um escravo do Sul. O seu pai era queniano. E isso muda tudo. Quer dizer que ele não reenvia aos outros americanos uma imagem culpabilizante. Não lhes reenvia a imagem do país da segregação, do Ku-Klux-Klan, do esclavagismo. É um negro que joga na sedução e não na culpabilização. A sua força está aí.

Escreve também bastante sobre a sua experiência com as comunidades árabes, sobre o facto de se sentirem americanos, ao contrário do que acontece na Europa.

Os americanos inventaram um sistema de cidadania, um modo de regulação dialéctica entre o particular e o universal, entre a origem e o destino, que funciona bastante bem. Na Europa e na França teríamos todo o interesse em inspirarmo-nos nisto.

Podemos voltar aos valores? Há hoje na Europa a ideia de que, depois de Guantánamo e de Abu Ghraib, a democracia americana não funciona. Visitou Guantánamo. Contesta essa ideia no seu livro.

Fui ver Guantánamo. É verdade que é inadmissível, que é um escândalo, que é uma zona de não-direito e que é indigna de uma democracia. Mas não é o Gulag. E os que nos vêm dizer que Guantánamo é o Gulag americano são cretinos, não têm a mínima ideia do que é o Gulag. O Gulag significa dezenas de milhões de mortos. Guantánamo significa centenas de prisioneiros sem direitos que não são bem tratados, sem dúvida, em alguns casos torturados. Eis um caso em que está diante de um verdadeiro cliché.

Compara a denúncia de Abu Ghraib com a denúncia do que se passou com a França na guerra da Argélia. Diz que eles foram mais rápidos a denunciar e a condenar.

A grande diferença entre a França e a América é que a França levou 40 anos para aceitar o seu Abu Grahib e a América levou três dias.

Porquê?

Porque a América é uma democracia mais viva que a França. Bastaram 48 horas para a América ser informada sobre Abu Ghraib, ficar horrorizada com Abu Ghraib e condenar Abu Ghraib. Há pouco falávamos de Obama e de Hillary Clinton. A América pode eleger no próximo ano uma mulher ou um negro. Portugal estaria preparado para isso?

Mas a França está, pelo menos no que diz respeito a uma mulher.

Mas está pronta a eleger um negro? E mesmo uma mulher? Vamos ver. Espero que sim. Mas olhe para a maneira como ela é tratada, a nossa mulher, Ségolène. Os insultos as insinuações.

Conversou longamente com algumas das figuras mais conhecidas entre os neoconservadores. As suas origens são as mesmas que as deles: vieram da esquerda, são anti-totalitários, vêm a democracia como valor universal. Também costuma apelar às democracias para agirem contra os tiranos. Qual é a diferença?

A diferença é que continuo a ser de esquerda e eles não. No plano moral, não há diferença. O problema deles não é serem imorais. Moralmente tinham razão. Claro que é preciso derrubar um ditador. Claro que a democracia é boa para todos os povos. Claro que os Direitos do Homem não são reservados aos ocidentais. Apenas há diferença no plano político. A responsabilidade de um Estado não é apenas ter razão nos princípios mas também ganhar no plano político. A guerra no Iraque, a maneira como foi conduzida, fez com que estivesse antecipadamente perdida. Para ganhar é preciso um consenso internacional, aliados no terreno e um plano de reconstrução. Foram as três coisas que faltaram à América.
Eles fizeram no Iraque os mesmos erros que fazem na América. Pensam que o Estado serve de pouco para combater a miséria, para os cuidados de saúde, que é preciso deixar o mercado livre funcionar. Fizeram o mesmo erro no Iraque: bastava derrubar Saddam e, depois, a Providência democrática faria o resto.

Diz no seu livro, já disse aqui, que a América não é uma nação imperial. Mas, depois da guerra-fria, começou a pensar-se como império.

Não tenho a certeza disso. A questão imperial é uma questão nossa, dos europeus. Fomos nós as nações imperais. O imperialismo é o nosso fardo. A América não tem um imaginário imperial, isso é falso. A verdadeira tentação da América, a sua tendência pesada e, talvez, o maior perigo é deixar cair o mundo... O isolacionismo.
Espero que a queda dos neoconservadores não tenha como efeito deitar fora o bebé com a água do banho. Abandonar toda a espécie de preocupação com o mundo.

Como é que explica que a ideia de uma Europa como anti-América seja sobretudo uma ideia francesa?

Não, não é apenas francesa. É verdadeira na Alemanha, na Espanha, na Itália, talvez em Portugal... Mas é verdade que nasceu em França. O anti-americanismo era uma ideia de extrema-direita...

Agora é de esquerda.

Se o anti-americanismo se transformar no programa da esquerda, isso será muito grave porque, na sua substância, é uma ideia fascista. É o reflexo dos fascistas franceses dos anos 20 e 30 face a uma nação democrática. É a reacção dos nostálgicos da nação orgânica, a nação baseada numa raça, num sangue, etc..., face à nação rousseauniana, que é a América. A América é uma incarnação do sonho de Rousseau, gente que vem de toda a parte e que, por um acto de vontade, decide fazer uma nação. Isto, os contra-revolucionários franceses do século XIX e, depois, os fascistas dos anos 20, viam como o seu o pior pesadelo. É daqui que nasce o anti-americanismo em França. Que, depois, passa para a Alemanha, como os românticos alemães, com os ideólogos nazis, com Heidegger. Ver uma parte da esquerda europeia ligada a este anti-americanismo de origem fascizante é algo que me aterroriza.

E isso é um problema para a integração europeia?

Sim. Creio que não se pode detestar a América e querer, ao mesmo tempo, a Europa. Porque, no fundo, a ideia de que a Europa é possível é a América que no-la dá. É já, de alguma maneira, uma Europa - povos diferentes, de tradições e memórias que não têm nada umas com as outras, que formam uma nação. É isto a América e é isto que tentamos fazer na Europa.

O que leva 70 por cento dos franceses a dizer que a França está em declínio? Ou, como se diz, como se explica este "malaise" de um país que é rico e, a muitos títulos, magnífico?

Isso vai mudar... O "malaise" é uma questão de memória. Há três acontecimentos recentes na nossa memória com os quais temos dificuldade em lidar. Vichy, a colonização e o Maio de 68...

Acha que podemos comparar o Maio de 68 com Vichy...

Não. Mas há uma relação difícil com o Maio de 68. Há uma parte da França que continua a pensar que foi uma coisa muito má, que os nossos males vêm daí.

Diz no seu livro, contrariando a percepção comum na Europa, que o terrorismo islâmico é uma forma de fascismo - o islamofascismo. É a mesma definição de Bush.

As pessoas na Europa crêem que a origem do terrorismo islâmico é a pobreza ou o Corão. Não é uma coisa nem outra. A sua tradição ideológica chama-se fascismo. É a sua verdadeira natureza. É uma questão política, não é uma questão religiosa.

Os americanos percebem isso melhor que nós?

Não, não creio. Eles estão mais na linha da guerra de civilizações, ou seja, uma guerra de religiões. Ora, não é nada disso, é uma batalha política contra gente que é fascista...

Porque defendem uma ideologia totalitária?

Li os fundadores dos Irmãos Muçulmanos, li os inspiradores de Komeini, li os fundadores do Partido Baas e verifiquei que as ideias que os alimentam são ideias europeias e, em grande parte, fascistas. Há também o Corão naturalmente. Mas o Corão é como todos os textos religiosos, permite várias interpretações. Se fosse só isso não estaria tão inquieto.

Saturday, April 21, 2007

Um mau caminho para a liberdade

Um mau caminho para a liberdade
21.04.2007, José Pacheco Pereira

Qualquer criminalização do pensar e do dizer é liberticida

V ai chegar a Portugal, pela via paternal da UE, a criminalização da negação do Holocausto. Negar a existência do Holocausto vai dar pena de prisão, embora se admita que diferentes interpretações nacionais possam coexistir em função da tradição legal de cada país. Tal significa - uma típica demonstração da forma como funciona a UE - que a legislação aprovada pelos 27 tanto pode ser aplicada como não.

Em Inglaterra não o será, em França já o é. O problema para nós é que, conhecendo a apetência do PS (e com ecos no PSD) pelo "politicamente correcto" e a necessidade do Governo em encontrar distracções grátis e inócuas para si, há todas as probabilidades de, daqui a uns dias ou uns meses, termos uma cópia portuguesa dessa legislação.

A negação do Holocausto é uma aberração histórica e um extremismo político. Com mais ou menos detalhe, com diferentes interpretações sobre o alcance e o significado do que aconteceu, é da dimensão do vudu acreditar que os milhões de judeus que viviam na Alemanha, Polónia, Lituânia, Bielorrússia, Ucrânia, Holanda, Grécia, etc., etc., desapareceram do mapa dos vivos sem se saber porquê. Pensar que grandes "cidades" judaicas como Vilnius, Varsóvia, Cracóvia, Amesterdão, Salónica deixaram de o ser por algum beam me up sideral é estúpido e absurdo, mas as pessoas devem ter o direito de serem estúpidas e absurdas mesmo sobre os cadáveres alheios.

Que a destruição sistemática e organizada dos judeus foi preparada pelos nazis é também um facto histórico inegável à luz dos documentos e testemunhos existentes.

Autores "revisionistas" como David Irving podem ter razão num ou noutros ponto de interpretação, mas a "história" que produzem não é história. Mas mandá-lo para a cadeia, onde ele aliás já esteve, por pensar mal, ou mesmo pensar de modo obsceno - como é natural que as vítimas do Holocausto pensem, negadas no seu sofrimento - é um atentado à liberdade.

Mas há outra razão que revela os contornos "politicamente correctos" da criminalização do negacionismo: a recusa pelos autores da actual legislação em condenar os crimes do comunismo com um estatuto semelhante ao do nazismo. No debate entre os governos da UE, os países bálticos insistiram nessa dupla criminalização, dos crimes de Hitler e de Estaline (e de Lenine, Mao Tsetung, Pol Pot, etc.) A maioria dos países europeus recusou a proposta báltica, vinda de países que conheceram bem o domínio soviético e aceitaram fazer, ao bom modo hipócrita da UE, umas "audiências públicas" sobre os "crimes de Estaline".

Ora se há contabilidade trágica dos mortos no século XX, ela é ganha à distância pelos crimes de Estaline e dos diferentes regimes comunistas. Trata-se também de factos históricos irrefutáveis, desde as execuções em massa ao Gulag, desde a deportação de povos inteiros até formas geradas por experiências de engenharia social, da colectivização forçada ao Grande Salto em Frente e à Revolução Cultural. Na URSS, na China, no Camboja, na Hungria, na Roménia, em Angola, na Zâmbia, na Etiópia, etc., etc., milhões de pessoas foram presas, executadas, varridas da face da terra, porque tinham na sua esmagadora maioria "culpas objectivas".

Mas isto pode-se negar, como fazem muitos partidos comunistas e muitos intelectuais de esquerda pelo mundo fora, ou pode-se omitir, o que é uma das mais perversas formas de negar.
Dito isto, eu não defendo qualquer salomónica condenação do megacinismo, defendo a liberdade de se ter e defender ideias, mesmo que me sejam repulsivas. É ela a essência da liberdade de expressão e repito-o pela milésima vez: é o direito do outro pensar de uma forma que me parece no limite obscena e vergonhosa. Mas é assim a liberdade e qualquer criminalização do pensar e do dizer é liberticida.

A obsessão actual de criar sociedades "limpas" da violência, da mentira, da crueldade, do racismo, da xenofobia é um dos aspectos mais liberticidas em curso nas democracias ocidentais e tem vindo a agravar-se nos EUA e na Europa.

Do tabaco ao Holocausto, da pornografia ao fast food, dezenas de leis nos protegem do mal. Pode-se dizer que criminalizar a negação do Holocausto não é a mesma coisa que proibir fumar em público.

De facto não é, é mais grave. Mas a atitude geral é a mesma absurda, prepotente, liberticida obsessão que nos chega do Estado e dos governos em obrigar-nos a "viver bem" e a "pensar bem", ou a ir para a prisão.

Tuesday, April 10, 2007

Perguntas que esperam pelo primeiro-ministro

Do Público:

As perguntas mais importantes que esperam uma resp
osta do primeiro-ministro

10.04.2007

As duas referências públicas do primeiro-ministro a este caso foram feitas por escrito – ao PÚBLICO e à SIC –, mas nunca responderam a questões concretas. Aqui ficam as questões mais importantes a que José Sócrates deve responder para clarificar o dossier:

1 Por que razão José Sócrates deixou o ISEL para acabar o curso na UnI?

2 José Sócrates pediu equivalência a 25 cadeiras das 31 que completavam a licenciatura da UnI. Acabou por receber equivalência a mais uma disciplina, ou seja, a UnI deu-lhe equivalência a 26 cadeiras. Por que motivo no ISEL teria de completar mais 12 cadeiras para se licenciar e na UnI apenas teve que fazer mais cinco?

3 António José Morais, então director do Departamento de Engenharia Civil da UnI, leccionou quatro das cinco cadeiras concluídas na Independente. Segundo o próprio, este grupo de disciplinas, algumas do 3.º ano, outras do 5.º, representava todas as cadeiras leccionadas por aquele professor na UnI. António José Morais foi, simultaneamente ao período em que lhe deu aulas, adjunto do secretário de Estado da Administração Interna, Armando Vara, colega de Governo de Sócrates, e mais tarde director do Gabinete de Equipamento e Planeamento do Ministério da Administração Interna.
3.1 José Sócrates já conhecia António José Morais antes de este ser seu professor na UnI?
3.2 António José Morais já havia sido seu professor no ISEL?
3.3 Por que razão José Sócrates não identificou António José Morais como tendo sido seu professor, nas conversas que manteve com o PÚBLICO, ao longo de uma semana?
3.4 Quantas horas de aulas por semana compunham o horário curricular?

4 Nessas conversas que manteve com o PÚBLICO, antes da publicação da primeira peça sobre o caso, Sócrates afirmou-se “insultado” pelas perguntas que lhe foram feitas, disse ter frequentado as aulas e concluído os exames com aproveitamento, mas nunca forneceu provas sobre o que afirmava.
4.1. José Sócrates não guardou nenhuma prova documental da sua carreira académica? Nunca levantou nenhum dos diplomas?
4.2 Qual o motivo que levou Sócrates a delegar no reitor da UnI todos os esclarecimentos, documentais ou testemunhais, sobre o caso, sabendo-se que Luís Arouca já havia estado na origem de indicações erradas sobre o seu currículo publicadas no jornal 24 Horas, em que terá referido cadeiras que não existiam no seu plano de curso?
4.3 Por que razão Sócrates se recusou sempre a responder por escrito às perguntas formuladas, também por escrito, pelo PÚBLICO?
4.4 Como é que, durante quase uma semana, não foi capaz de citar um seu colega ou um dos seus dois professores da UnI?
4.5 Qual o motivo por que não apresentou, por exemplo, a sua monografia de Projecto e Dissertação, tese final do curso?

5 Da matrícula de José Sócrates na UnI consta que não apresentou qualquer documento de prova das cadeiras já feitas no ISEC e no ISEL e só apresentou atestado das 12 cadeiras concluídas no ISEL, em Julho de 1996, ou seja, quando estava praticamente a concluir o curso na UnI.
5.1 A que se deveu este atraso?
5.2 Como pôde a UnI aceitar a inscrição, aprovar um plano de equivalências, permitir a frequência de aulas e a realização de exames sem o documento que atestava as cadeiras finalizadas no ISEL?

6 Quatro notas das cadeiras concluídas na UnI foram lançadas em Agosto e o diploma tem data de 8 de Setembro de 1996.
6.1 Sabendo-se ser anormal o lançamento de notas em Agosto, bem como a passagem de diplomas ao domingo, que justificação é dada para isso?

7 Numa das folhas consultadas pelo PÚBLICO aparece a palavra “isento” no topo da página.
7.1 Sócrates pagou propinas?
7.2 Que valor foi fixado?
7.3 A despesa entrou no IRS?

8 O reitor Luís Arouca disse por várias vezes que só conheceu Sócrates quando este ingressou na universidade. No entanto, em trocas de correspondência anteriores, Sócrates despedia-se “... do seu, José Sócrates”.
8.1 Quando é que Luís Arouca e José Sócrates se conheceram?

9 A que se referia José Sócrates quando, num fax enviado a Luís Arouca que está no seu dossier de licenciatura, escreveu: “Caro Professor, aqui lhe mando os dois decretos (o de 1995 fundamentalmente) responsáveis pelo meu actual desconsolo.”

10 Por que motivo não foram corrigidos todos os erros constantes da biografia publicada no Portal do Governo, mantendo-se a referência errada a uma pós-graduação em Engenharia Sanitária e continuando a ser omitido o MBA em Gestão já depois de o termo “engenheiro” ter sido substituído pelo de “licenciado em Engenharia Civil”?

Monday, April 9, 2007

Há mais alunos para além de Sócrates

Do Público de 9/4/2k7

Há mais alunos para além de Sócrates
09.04.2007, Santana Castilho

A forma como a Universidade Independente documentou o percurso académico de Sócrates é uma bizarra trapalhada

Apesar de serem antigas, na "blogosfera", as referências ao percurso académico de Sócrates e de nem sequer ter sido a peça do PÚBLICO a primeira a aparecer na comunicação social escrita, foi a decisão editorial deste jornal, secundada pelo Expresso, que, definitivamente, deu aos factos repercussão nacional.

A forma como a Universidade Independente documentou o percurso académico de Sócrates é uma bizarra trapalhada.

Recordemos alguns dos factos publicados pelo PÚBLICO e pelo Expresso: coisas a que chamam documentos não estão assinadas, não têm data nem timbre, nem qualquer carimbo, nem sequer numeração; não existem "livros de termos"; a decisão sobre a equivalência foi tomada sem que o processo estivesse instruído com um único documento oficial relevante; segundo o então reitor, "... as fichas de cada aluno já ninguém sabe delas...", "... nos primeiros anos a nota final é acompanhada com fundamento, depois é deitada fora..." e, quanto ao registo de pagamento de propinas, "... ao fim de cinco anos vai tudo para o maneta..."; o presidente do Conselho Científico diz nunca ter visto Sócrates e diz que o seu processo de equivalências jamais foi submetido a qualquer órgão académico; o diploma de Sócrates foi passado a um domingo; um estudo do oficialíssimo Observatório da Ciência e do Ensino Superior, a que presidiu a actual ministra da Educação, diz não ter havido licenciados pela Universidade Independente no ano e no curso em que Sócrates se diplomou e as explicações oficiais para a contradição são deploráveis, quando confrontadas com as explicitações do próprio documento.

Face a tudo isto, a dúvida está instalada e a credibilidade dos diplomas outorgados ao aluno Sócrates e aos milhares que o antecederam e sucederam irremediavelmente manchada. É aqui, na protecção devida aos alunos, que reside o lado mais importante da questão, não sublinhado pelo que tem vindo a público: o falhanço estrondoso, ao longo dos anos, da fiscalização do Estado sobre a actividade privada desta universidade (e das outras?).

As disposições legais vigentes exigiam que o Estado conhecesse o nome dos alunos, os planos de estudo e os professores respectivos, ano por ano. A lei vigente obrigou sempre à existência de um Conselho Científico, em cujo estrito âmbito deveriam ter sido tomadas as decisões que estão na base das notícias. Como obrigou sempre a instrumentos óbvios de registo, cuja efectividade e segurança incumbiam também ao Estado, através da sua função fiscalizadora.

Hoje, Mariano Gago dirá ao país se fecha ou mantém aberta a Independente. Mas não dirá uma palavra sobre o mais importante, ou seja, por que falhou o Estado na sua função fiscalizadora e que medidas tomará, de imediato, para nos garantir a não-repetição destes factos, noutras instituições.

Em 26 de Março escrevi aqui que Mariano Gago parecia observar de longe o velório da Universidade Independente. Hoje vai promover a sua ressurreição ou decretar-lhe o óbito. Por razões que a prudência não me deixa explicitar, antecipo que o veredicto ditará a continuidade, quando só a autópsia poderia ser útil.

Ao que parece, hoje, segunda-feira, também Sócrates poderá quebrar o silêncio a que se tem remetido. Se o fizer, embora tarde, para seu bem e em defesa da dignidade do cargo que ocupa, espero que resulte inequívoco que nunca o ora primeiro-ministro recorreu a expedientes ilegítimos para obter títulos académicos nem, por forma alguma, algum departamento do Estado está refém da Universidade Independente. Porque são essas as questões que interessam ao país, para além da que acima ficou enunciada.

Finalmente, que este episódio sirva para ajudar o país:

1.º Na reflexão, que não está a ser feita, sobre a ânsia de aumentar o protagonismo da iniciativa privada e do mercado na definição das políticas educativas. A saga da Independente deveria levar-nos a ponderar até onde nos pode conduzir a gradual desresponsabilização do Estado e o galopante desmantelamento da escola pública.

2.º A sair do provincianismo que o caracteriza. É tempo de deixarmos de indexar o valor das pessoas à nobiliarquia académica e a retirar razão a Almada Negreiros quando dizia que "... a nossa querida terra está cheia de manhosos, de manhosos e de manhosos, e de mais manhosos. E numa terra de manhosos não se pode chegar senão a falsos prestígios. É o que há mais agora por aí em Portugal: os falsos prestígios!"
Professor do ensino superior


Thursday, March 15, 2007

O novo eixo do mal

O novo eixo do mal
15.03.2007, Esther Mucznik
O pacifismo a qualquer preço é hoje o principal credo europeu
1Israel e o Irão, os EUA e a Coreia do Norte são, por ordem decrescente, os países mais mal vistos do planeta, os que "pior influência exercem", segundo os resultados de uma sondagem a 28 mil pessoas de 27 países, entre os quais Portugal. A sondagem, realizada para a BBC entre Novembro e Janeiro, pedia às pessoas que classificassem a influência de 12 países: Canadá, China, Coreia do Norte, Reino Unido, EUA, França, Índia, Israel, Japão, Rússia, Venezuela.

Israel é o "vencedor", com 56 por cento de opiniões negativas e apenas 17 por cento de positivas. Seguem-se o Irão, com 54 por cento, os EUA, com 51 por cento, e a Coreia do Norte, com 48 por cento. Em contrapartida, as opiniões mais positivas vão para o Canadá, o Japão, a União Europeia e a França. Pelo meio, fica a China, com mais respostas positivas do que negativas, a Venezuela, com empate de opiniões, e a Rússia, com uma avaliação ligeiramente mais negativa.

Não deixa de ser significativo que países europeus como a Alemanha, a França e a Grã-Bretanha estejam entre os que pior opinião têm sobre a influência de Israel no mundo, opinião que se estende, embora de forma mais suavizada, também aos EUA.
Como interpretar estes resultados? Como interpretar esta visão que julga com os mesmos critérios e coloca praticamente em pé de igualdade regimes ditatoriais e fomentadores do terrorismo, de um lado, e sociedades livres e democráticas, do outro?

É evidente que a natureza das perguntas e o momento em que são feitas condicionam parcialmente as respostas. O estudo levado a cabo pela GlobeScan em parceria com a Universidade de Maryland foi iniciado poucos meses depois da guerra do Líbano, com a memória das pessoas ainda cheia das imagens de destruição e violência do Líbano. Mas isto não invalida a principal conclusão desta sondagem: para a grande maioria dos entrevistados não há relação nenhuma entre a paz e a segurança de um lado, a liberdade e a democracia do outro. Em termos de ameaça mundial, os regimes políticos equivalem-se.

Na opinião do director do estudo, Steven Kull, "as populações tendem a ver negativamente os países cujo perfil está marcado pelo uso da força (...) e positivamente os que mantêm uma relação pacífica com o mundo". Ninguém duvida, com efeito, que a guerra é o pior dos pesadelos e os povos, particularmente na Europa, têm dela uma memória dolorosa e traumatizada. Mas a questão não está aí. Está, sim, no alvo do dedo acusatório - Israel e EUA -, quando debaixo dos nossos olhos se desenrola a mais bárbara, a mais cobarde e a mais assassina de todas as guerras: a guerra contra os civis.

No Iraque, no Afeganistão, na Tchetchénia, no Darfur, no Magrebe, são utilizados os meios mais selvagens e cruéis: atentados em hospitais por terroristas disfarçados de pessoal médico; bombas nas universidades contra estudantes, nas mesquitas contra fiéis, nos lugares santos contra peregrinos; devastação à bomba do coração cultural de Bagdad onde os livros também são um alvo; cadáveres mutilados por torturas hediondas atirados para valas comuns; raptos, decapitações e agora, supremo requinte, aparição do terrorismo químico, à base de cloro - irmãos contra irmãos, árabes contra árabes, muçulmanos contra muçulmanos, não poupando velhos, mulheres e crianças.

Quem protesta contra esta guerra? Ninguém. Ela deixa-nos indiferentes, cegos que estamos pela "evidência" de que tudo é culpa de Israel e dos EUA. Impune, a barbárie pode continuar: de todas as formas ela será sempre atribuída a americanos e israelitas. Nem os europeus, nem muito especialmente o mundo árabe e muçulmano têm a coragem de denunciar o que se passa. Preferem enganar e serem enganados, diabolizando Israel e os EUA. O ódio a Israel e à América oculta a barbárie do nosso tempo.

Os países árabes moderados temem represálias dos seus grupos integristas e ser acusados de fazer o jogo do grande e do pequeno Satã. E os europeus, o que temem? Os europeus têm medo. Medo da guerra, medo do terrorismo, medo das "suas" comunidades islâmicas. Consideram o Irão uma ameaça, mas receiam mais o confronto do que a própria ameaça. "Enquanto os israelitas subscrevem a máxima "Nunca mais", a dos alemães é "Nunca mais a guerra"", afirma o alemão Stephan Vopel. O pacifismo a qualquer preço é hoje o principal credo europeu.

2É por isso que não posso deixar de encarar com cepticismo o repto, apoiado pelo PÚBLICO, que nos propõe o historiador inglês Timothy Garton Ash, ao sugerir a construção de uma "nova narrativa europeia" com base nos valores da liberdade, da paz, do respeito pela lei, da prosperidade, diversidade e solidariedade. Quando vemos que uma ditadura como a de Teerão, em oposição frontal aos valores acima classificados como europeus, é considerada menos perigosa para o mundo do que Israel; quando vemos que países "livres" e "democráticos" como a Rússia, China, a Venezuela e a Coreia do Norte obtêm uma opinião mais favorável do que os EUA, não me resta a menor ilusão da vontade, nem da capacidade europeias de construir "essa nova narrativa". Parece-me, sim, que a Europa continua presa aos fantasmas do passado, projectando uma imagem de si própria que não é capaz de assumir na prática, mirando-se a um espelho deformado que lhe devolve uma imagem do que ela gostaria de ser, mas não é.

E, enquanto se mantiver uma equivalência política e moral entre países onde os direitos do homem são por vezes violados - o que obviamente não os desculpa - e aqueles onde essa violação é a sua própria natureza e base de sustentação, não acredito que a Europa seja capaz de combater pelos valores acima descritos. Hoje, a "narrativa" europeia resume-se a três palavras: sossego, segurança e bem-estar. Para si própria, naturalmente...

Hagiografia da mediocridade

O estilo e a substância
15.03.2007, Constança Cunha e Sá
O estilo do primeiro-ministro confirma apenas a sua falta de substância
Em Portugal, há uma suave combinação entre o poder e a arrogância que leva invariavelmente ao mito e à hagiografia. Em 1990, quando o cavaquismo decidiu vender uma imagem diferente do chefe, o Expresso deu à luz um trabalho de fundo, sob um título auspicioso: A história do menino Aníbal. Como mandam as regras da propaganda, A história do menino Aníbal oferecia-nos "o retrato de um vencedor" e o percurso de um "predestinado" que "o acaso" empurrara para a política, a bem da modernização do país e da felicidade dos portugueses.

A biografia, recheada de pequenos e coloridos episódios, revelava um "novo" Cavaco Silva, surpreendentemente humano (havia dúvidas sobre a matéria!) nos seus pequenos prazeres e nas suas inocentes "tropelias". Para deleite de todos os fiéis, ficou-se a saber que, por trás do rosto esquálido e austero do primeiro-ministro, havia um "Aníbal" traquinas que gostava de pingue-pongue e de matraquilhos e que subira a pulso na vida.

Ungido pelo mérito, o rapaz pobre de Boliqueime, que fazia parte dos "costeletas" (por oposição ao grupo privilegiado dos "bifes"), acabara por se transformar num mago da economia, com doutoramento a preceito e provas dadas no desprezível mundo da política. Na altura, quando o regime celebrava a existência de um "novo português" que se distinguia pela "vontade de vencer", o exemplo de Cavaco Silva, educado no esforço e na disciplina, era a confirmação de um sonho que animou esses excepcionais anos de falsa prosperidade.

Apesar da sua aridez e da limitação dos seus horizontes, a história do "menino Aníbal" tinha, apesar de tudo, um sentido que ultrapassava a mera glorificação do chefe e do seu grandioso "destino". Entre os sacrifícios da infância e o posterior brilho da academia, a biografia não deixava de encerrar o essencial do cavaquismo. Ou, dito de outra forma, o essencial de uma velha e recorrente tradição nacional que privilegia o esforço e o mérito em detrimento dos "interesses" mesquinhos dos partidos, que defende o primado da competência sobre as subtilezas da ideologia e que, em última análise, se baseia na superioridade da economia face às "intrigas" em que se entretém a política. Neste sentido, o retrato de Cavaco Silva é também o retrato de um país que procurou sempre fugir às suas responsabilidades através dos bons ofícios de um qualquer salvador que o resgatasse do seu proverbial atraso e da sua irremediável pobreza.

O que impressiona na biografia do eng. Sócrates, publicada, este fim-de-semana, pelo semanário Sol, é o imenso vazio em que se afundam as inúmeras qualidades atribuídas ao biografado. Em vinte páginas de prosa, ao longo das quais vamos assistindo ao harmonioso desenvolvimento do pequeno Zezito, não há um pormenor que o diferencie, um traço que o caracterize ou uma ideia que o distinga - e muito menos algo que o determine à nascença para o exercício do poder, como assegura o título escolhido pelo semanário para coroar esta hagiografia da mediocridade.
Na história do "menino Zezito", não há esforço, nem sacrifício.

Também não há proezas académicas. Nem feitos profissionais. O bacharelato no ISEC - que tantas dúvidas tem levantado - é completado, vinte anos depois, quando já se encontrava no Governo do eng. Guterres, com uma obscura licenciatura, na Universidade Independente.

Pelo caminho, e dando provas da sua vocação para a política, mergulha, com o amigo Jorge Patrão, "nos meandros socialistas da região". Ou seja, envolve-se nas pequenas guerras do aparelho, onde gasta o melhor dos seus dias e inicia a sua fulgurante carreira.

Em 1987, depois de se ter enfiado no sótão do eng. Guterres e numas intrigas de maior alcance, chega finalmente ao Parlamento, onde viceja discretamente durante os anos do cavaquismo. Ao contrário do que a sua "coragem" e "determinação" poderiam indiciar, José Sócrates, esse estadista de última hora, foi sempre um homem do aparelho, um cacique local que cresceu nos jogos partidários e se distinguiu nos golpes de bastidores.

Antes de assentar na política, não deixou de fazer umas breves incursões profissionais. Em 80, deu aulas de Matemática no Liceu da Rainha D. Leonor. E, um ano mais tarde, arranjou um "posto" na Câmara Municipal da Covilhã, onde se distinguiu pelo "estilo", fugindo, como diz o jornal, ao "estereótipo do senhor engenheiro" que ele, para todos os efeitos, não era. Mas usava "calças encarnadas" - o que já então revelava uma aversão às regras da burocracia que se veio a corporizar, mais tarde, na apresentação do programa Simplex.

É com este extraordinário curriculum que chega, em 95, ao Governo, pela mão do eng. Guterres, de quem foi sempre um solícito boy. Mantém-se firme, ao seu lado, até ao fim, quando o seu tutor político abandona as funções de primeiro-ministro depois de ter deixado, segundo as suas próprias palavras, o país "à beira do pântano". Uns anos mais tarde, surge a consagração mediática, com um frente-a-frente, na RTP, com Pedro Santana Lopes, uma das grandes estrelas desse restrito firmamento. Diz este último que o conhece como ninguém. E acrescenta: "Há duas pessoas na política que perceberam o meu método e, nalguns aspectos, seguem os meus passos: o Carrilho e o Sócrates." Por uma vez, uma pessoa sente-se tentada a dar-lhe razão. O estilo do primeiro-ministro confirma apenas a sua falta de substância.

Wednesday, January 31, 2007

Eduquês à solta

No Público de hoje, por Guilherme Valente:

Apesar das correcções e da pressão que, suponho ir verificando, o chefe do Governo tem exercido, a actual ministra não mexeu, nem ao de leve, em nada de essencial, isto é, não contrariou a infecção ideológica e pedagógica, alimentada por uma espécie de União Nacional dos "especialistas", que domina o ministério e sempre conseguiu impor-se ou bloquear os ministros

1.O que pensar da medida, agora prevista, de um só professor para todas as disciplinas no segundo ciclo do básico? Não ocorrerá logo a uma mente sensata que isso seria mais um passo na infantilização dos alunos, outra etapa na degradação do ensino, na desqualificação da prestação dos docentes? Não fala a ministra recorrentemente em querer obter resultados? Assim? Que professor, com que formação, dominará o conhecimento nas várias matérias para as poder ensinar com competência e sucesso? A não ser que os docentes tenham que saber apenas pedagogia e o domínio das várias matérias disciplinares não seja importante. De facto, como vários analistas têm referido e já foi mesmo chocantemente assumido por especialistas menos "políticos", para as teorias pedagógicas que dominam o sistema de ensino a transmissão e aquisição de conhecimentos parece ser irrelevante, esse parece não ser um objectivo nuclear da escola. Como pode a senhora ministra falar em obter resultados? E como os verificará?
A lógica e a coerência da medida agora prevista só pode ser mais uma manifestação do delírio cretinizador, que continua a comandar o sistema educativo, à revelia, agora, estou certo, do conhecimento e dos propósitos do chefe do Governo. Mais um combate que a opinião pública terá de travar?
Manifestando em todas as oportunidades a sua animosidade contra os exames, esta ministra quis, ou deixou que se pretendesse, acabar com o exame de Português, lembram-se? E a opinião pública obrigou-a a recuar. Depois seguiu-se o escândalo incompreensível dos exames de Química. Ontem foi a TLEBS; agora o fim do exame de Filosofia (não me lembro de decisão pedagógica e cívica tão ignorante e insensata como esta, a não ser, mais uma vez, que fosse de propósito); amanhã a alteração aparentemente absurda do regime de docência no básico, que será, de todos os erros, o que é mais imperativo travar.
Mas poderemos estar sempre atentos a tudo, tantas são as medidas aberrantes, mas muitas mais discretas, não tendo, por isso, a cobertura dos media que alerta os cidadãos? Poderá tal situação continuar, a opinião pública a ter recorrentemente de se mobilizar para corrigir os erros da ministra? Inaceitável forma de governar: a ministra pensa, ou avaliza e promove medidas catastróficas, a opinião pública reage e o ministério recua. É a opinião pública a governar pela ministra, uma necessidade que, todavia, se pode deduzir, infelizmente, das suas próprias palavras:
Não lavou a senhora ministra as mãos da sua responsabilidade na referida "bronca" do exame de Química, dizendo que não tinha que conhecer nem se metia no que era da responsabilidade dos especialistas? Não afirmou, noutra ocasião: "Acho que as questões técnicas da pedagogia não devem vir para a esfera da actividade política"? E deu mesmo um exemplo, de igual brilho: "Seria o mesmo que o ministro da Saúde dizer qual a melhor técnica de diagnóstico para um problema de saúde." Acontece, diga-se de passagem e sem esperança de convencer quem possui ideias tão elaboradas e as sustenta com tal indiferença pela crítica, que o ministro da Saúde não faz, felizmente, outra coisa, isto é, assume a responsabilidade política pela qualidade e a eficácia de todas as acções do seu ministério, escolhendo os especialistas em que se apoia e acompanhando e avaliando o resultado da sua intervenção. De resto, se em cada operação nos hospitais morresse um doente - e é algo idêntico o que desde há muitos anos está a acontecer na nossa escola -, o que faria o ministro Correia de Campos? Diria, como a ministra, que o problema é dos técnicos e, subentende-se o seu recado, que nós cidadãos não teríamos nada com isso?
Adivinha-se o desejo da ministra, a mensagem subliminar nas suas palavras, mas arrepia imaginar o que seria se todos pensássemos como ela, imaginar que pudéssemos estar no país em que, parece podermos concluir, a senhora gostaria de viver.
E quem são esses especialistas que a senhora ministra segue, de um modo que lembra a atitude do iletrado ignorante que toma como verdade inquestionável o disparate mais absurdo pelo facto de o ter num livro ou ouvido da boca de um especialista qualquer? São precisamente os "especialistas" que conduziram à tragédia educativa que já ninguém nega. Parece não haver outros para a senhora ministra, deuses únicos que segue acrítica e, talvez, temerosamente.

2. Foi chocante a TLEBS? Então leia-se o Referencial de Competências, Chave para a Educação e Formação de Adultos, Nível Secundário (o título é logo uma pérola), agora publicado pelo ministério.
Um documento que não posso acreditar tenha sido visto pelo primeiro-ministro. Se o tivesse lido não o deixaria publicar. Um longuíssimo discurso - provavelmente ninguém terá pachorra para o ler até ao fim - que não poderá suscitar, enquadrar, orientar, qualquer realização com resultados efectivos. Pelo contrário, é mais uma das inutilidades retóricas do costume que, como a generalidade das toneladas de papéis elaborados no ministério, só servirá para complicar e bloquear o sistema.
Seria hilariante se não fosse trágico.

3. Apesar das aparências, enganaram muito boa gente, a intervenção da senhora ministra no plano administrativo e laboral, dita corajosa, mas na minha opinião cega e desastrosa, que resultados teve de facto? Uniu os sindicatos como nunca estiveram antes, reaproximou deles a generalidade dos professores, legitimando a acção sindical que, durante todos estes anos, os fez cúmplices (por vezes contra natura da ortodoxia filosófica ou ideológica de que o mais importante deles se reivindica) da tragédia educativa que corrói e inviabiliza o país, levando ao adiamento da sua reconversão - que já se vislumbrava - no sentido de passarem a desempenhar, finalmente, o papel regulador que deve ser o seu, contributo inestimável para a segurança dos profissionais, a mudança do ensino e o progresso do país.
Apesar das correcções e da pressão que, suponho ir verificando, o chefe do Governo tem exercido, a actual ministra não mexeu, nem ao de leve, em nada de essencial, isto é, não contrariou a infecção ideológica e pedagógica, alimentada por uma espécie de União Nacional dos "especialistas", que domina o ministério e sempre conseguiu impor-se ou bloquear os ministros.
Marçal Grilo, Oliveira Martins e Júlio Pedrosa não varreram o eduquês, mas a sua estatura intelectual e académica, experiência profissional, espírito crítico e sensatez permitiram-lhes travar várias das manifestações mais delirantes da praga. Agora, pelo contrário, parece-me mesmo haver uma identificação da ministra à ideologia e à nomenclatura ou então uma subordinação como nunca se verificou antes. É o que parece transparecer de afirmações suas.
Mas julgo vislumbrar a mudança no horizonte. Este actual estádio supremo do eduquês deverá ser também o seu estertor. E julgo ter boas razões para pensar que a mudança vai acontecer com José Sócrates. Não é possível adiar mais e ele percebe onde está a essência do problema e acredito, e apoio, a sua atitude reformadora. Enganou-se com a ministra, mas estará a verificar o engano e irá corrigi-lo. Os próximos resultados vão ser piores e o chefe do Governo sabe que não haverá desenvolvimento nem diminuição das desigualdades sem outra escola, sem um ensino que desafie alunos e professores, que qualifique e forme, que realize as diferentes potencialidades de todos. Editor

Tuesday, January 30, 2007

Neta da última "bruxa" presa no Reino Unido em campanha para limpar o nome da avó

Do Público de hoje:

"Esteve nove meses na cadeia e foi visitada por Winston Churchill; morreu em 1956.

Helen Duncan nasceu na Escócia em 1827. E nos anos 40 do século passado tornou-se numa médium famosa. Conta-se que entre os seus clientes estavam várias personalidades, entre as quais Winston Churchill. Agora, 50 anos depois da sua morte, uma neta sua dá a cara por uma campanha destinada a limpar o nome de alguém que a justiça condenou com base numa lei do século XVIII: Helen Duncan foi uma das últimas mulheres a serem presas por bruxaria, no Reino Unido.

Chama-se Mary Martin a neta de Helen Duncan. Tem 72 anos e é responsável por uma petição (www.prestoungrange.org/helenduncan) que reclama um perdão póstumo para a avó, que morreu em 1956. "Ela não cometeu nenhum crime", diz, em declarações à Associated Press (AP).

Mary Martin, que vive na Escócia, conta como quando era pequena era gozada pelos colegas de escola. "Diziam: "És a neta de uma bruxa." Mas ela era apenas uma mulher com um dom." Na cidade onde vivia, o caso que envolveu a sua avó caiu que nem uma bomba. Mary nunca se livrou do estigma de ter uma avó "bruxa".

Recentemente, escreveu ao ministro do Interior britânico, John Reid, e pediu-lhe uma audiência. E tem-se desdobrado em entrevistas para publicitar a sua campanha. Várias centenas de pessoas já assinaram a petição, assegura a AP.

A história de Duncan foi recentemente contada numa reportagem do diário britânico The Guardian. Curiosamente, os problemas da famosa médium começaram durante a II Guerra Mundial, por causa de um navio: o HMS Barham.

O barco tinha-se afundado, mas as autoridades britânicas não revelaram de imediato o facto para que a tragédia não desse cabo do moral colectivo. Contudo, Duncan falou do acidente - contou aos pais de um marinheiro que o seu filho teria morrido a bordo do navio que se afundara. Considerou-se então que Duncan e os seus poderes misteriosos estavam a pôr em causa a segurança pública, numa altura em que as autoridades militares preparavam em segredo o Dia D.

Em Janeiro de 1944 a polícia entrou-lhe pela casa. Foi acusada de prática de "magia negra" e presa durante nove meses com base numa lei de 1735 - a primeira acusação do género num século, segundo conta o The Guardian.

Duncan cumpriu pena num presídio no Norte de Londres, onde chegou a ser visitada pelo primeiro-ministro Churchill, que, ainda de acordo com o jornal, considerava a sentença uma "patetice".

De resto, em 1951 Churchill acabaria por revogar essa lei do século XVIII que punha atrás das grades as alegadas "bruxas". Mas Helen Duncan morreu com o peso da acusação que a levou à cadeia."

Wednesday, January 17, 2007

Primeiro filosofar

No Público de hoje, Eduardo Prado Coelho

o fio do horizonte


Éverdade que a tradição cultural portuguesa sempre foi no sentido da história e não da filosofia. E que mesmo no domínio da filosofia foi a marca da filosofia francesa que predominou (Bachelard, como exemplo) e não a filosofia de cariz analítico (Popper). Daí que certos nomes famosos da filosofia contemporânea nunca tenham sido traduzidos (Quine ou Michael Dennett, também por exemplo, mesmo que alguns tenham sido objecto de extensos e bem organizados trabalhos: Sofia Miguéis é um caso).

De qualquer modo, a recente ideia do Ministério da Educação de manter o ensino da Filosofia, mas não o tornar obrigatório para o exame final parece-me desastrosa. No Expresso, António Guerreiro escreveu um magnífico texto sobre este tema. As consequências são múltiplas: os departamentos de Filosofia tenderão a fechar por escassez de participantes. E teremos esta aberração de uma Faculdade de Ciências Sociais e Humanas não ter Filosofia!

Deveria apoiar-se todo o sentido do secundário nessas duas grandes disciplinas da arte de pensar: a Matemática e a Filosofia. Elas são complementares, por muito que pensemos que são antagónicas. Essa complementaridade é o essencial da filosofia cognitiva dos nossos dias. Depois cada um reforça uma das múltiplas inteligências (Howard Gardner) que possui: uns pensam com números, outros com imagens (cinema e televisão), outros ainda com sons (música e dança). O que é que estamos a verificar com as actuais e infelizes disposições do Ministério da Educação nesta matéria?

Vemos que é uma concepção do mundo para a qual a filosofia estabelece uma fronteira de resistência. João Lobo Antunes fala com extrema clareza na importância da neurofilosofia (fê-lo de um modo extremamente veemente no programa Câmara Clara de Paula Moura Pinheiro). Nuno Crato, esse combatente indomável contra o "eduquês, considera importantes as relações entre a ciência, em particular a matemática, e a filosofia.


A que é que se resiste? A algo de particularmente nefasto que resulta daquilo a que de um modo sumário se chama "economicismo". Ao ensino superior recomenda-se hoje que sirva o mercado e que se concentre nas disciplinas que apontam nesse sentido. É triste, é mesmo desolador. Vamos ter uma filosofia em Portugal que se restringe a pequenos círculos de amigos que pretendem falar de metafísica: nem sequer é Carnap contra Nietzsche. É Berlusconi que espreita a cena.

É claro que todos nós sabemos que a filosofia é uma coisa, que, se em certos aspectos pode ser útil (nas questões de ética, por exemplo, fundamentais para entendermos os mecanismos da corrupção), noutros é decerto totalmente inútil. O domínio da metafísica vai nesse caminho: tudo aquilo que parece resposta é a rampa de lançamento para uma interrogação. Dizia Valéry que a filosofia consiste em pensarmos que aquilo que foi pensado não foi suficientemente pensado.

Falar nisto tem uma razão de ser: nós sentimos que estamos hoje num processo de barbarização que parece sem fim. Tanto mais grave entre nós quanto a modernidade nunca chegou a enraizar-se suficientemente. Mas vemos indícios disto em todos os domínios: desde Filipe la Féria no Teatro Rivoli em nome do público que vai vir meses a fio (e, no entanto, sempre que lá fui vi salas com bastante gente) à televisão que aposta em telenovelas, umas melhores outras piores, mas que relega os programas culturais (como, por exemplo, esse apaixonante diálogo entre Agustina Bessa Luís e Maria João Seixas) para os doentes de insónias, às salas de espectáculo - talvez com a excepção das artes visuais.

Donde, é preciso resistir. Estará o Ministério da Educação ainda em condições de alterar a sua decisão?

Thursday, January 4, 2007

A execução de Saddam Hussein

José Pacheco Pereira hoje no Público:

"Antes de se falar da morte de Saddam, o que "fala" nas imagens que vimos na televisão é a morte. No nosso mundo liofilizado europeu, a Ceifeira vê-se pouco. É escondida nos hospitais, disfarçada em quartos obscuros, cuidadosamente retirada da nossa vista. Ali, numa qualquer instalação policial ou militar, com o ar frio do cimento nu, às horas perigosas da madrugada, um homem como nós defronta tudo. Como nós. Ali, naquele momento, não há qualquer distinção. É ele e somos nós. O morto que ainda está vivo, anda, fala. Dead man walking, como se diz nos corredores da morte texanos.

Não há diálogo com a Ceifeira, não há palavras que possam ser ditas. Saddam portou-se com dignidade, embora eu não saiba bem o que significa esta frase, ou sequer se tem algum sentido dizê-la. Tivesse ele chorado, implorado, ou exibido um medo evidente e haveria alguma diferença? Havia para nós, o medo dele seria ainda mais o nosso. Assim como foi, alimenta a nossa vaidade, de que possamos também defrontar assim a Ceifeira e por isso ter essa "dignidade", forma última da nossa humanidade, prometeica a seu modo arrogante, diante do executor humano e divino.

Os brutos e os cruéis também podem ser dignos face à morte, isto, para quem saiba alguma coisa de história, não é novidade nenhuma. Aquele homem ali no cadafalso não era um homem comum, nem a morte lhe era alheia. Bem pelo contrário, Saddam matou, mesmo com as suas mãos, e deixou atrás de si um rastro de assassinatos, crimes e violências que o colocam entre os grandes criminosos políticos do século XX, numa indiferença brutal.

Naquela sala, ele estava no seu ambiente, ele melhor que ninguém percebia todos os papéis, dos carrascos, da vingança tribal e religiosa, da pura habituação à morte violenta, o convívio próximo de muitos iraquianos com a Ceifeira, mais que próximo, íntimo. Se alguma coisa o podia surpreender, era até a relativo carácter asséptico daquela execução, tão encenada, limpa, sossegada. As coisas depois perderam um bocado o pé, com os insultos e os gritos, mas tenho a certeza que foi incomensuravelmente mais pacífica do que os hábitos da casa.

Não foi o espectáculo que foi brutal, foi a morte, como é sempre, aqui com a agravante de ter sido decidida por homens e não pelo fluir do destino. Se há adquirido civilizacional numa parte do "Ocidente", é que os nossos governantes máximos, políticos, juízes, polícias, perderam o direito de decidir sobre a vida e a morte dos que os afrontam, quer a eles, quer à sociedade. O fim da pena de morte é um adquirido crucial, frágil como todos, mas para já garantido em grande parte da Europa, embora mais recentemente do que se pensa.

Mesmo assim, o assassinato político que acompanhou a nossa história, e que ainda há poucos anos matou Ceausescu e a mulher (esqueceram-se dos Ceausescu os jornalistas que repetiam na sua ignorância que no século XX "nenhum" ditador conheceu o destino de Saddam, pensando certamente que foi esta a "justiça" que faltou a Pinochet, que muitos que choram por Saddam desejavam ver morto), parece uma excepção, não o sendo. Que o digam os presidentes tchetchenos.

Mas uma coisa é ser radicalmente contra a pena de morte, como sou, outra é usar, com a "má fé" que Fernando Gil tão bem retratou, essa condenação como mais um argumento contra a invasão americana do Iraque. A discussão da invasão americana e dos sucessos que se lhe seguiram é hoje tão dominada pela irracionalidade e pelo "pensamento único" que nos impede pura e simplesmente de pensar.

Aliás, nunca encontrei melhor exemplo do que possa ser o "pensamento único" do que a completa unanimidade agressiva sobre os eventos do Iraque. Bastava sequer ouvir a cena macabra dos últimos momentos de Saddam, para perceber como para os iraquianos presentes, entre os quais o próprio Saddam, o que está em jogo está muito para além do binómio ocupação-resistência e já lá estava muito antes da invasão."

Se se quer discutir a sério o papel político da execução de Saddam, então é preciso em primeiro lugar libertarmo-nos de usar a condenação da pena de morte como argumento, porque ele é em si muito irrelevante no Iraque, nem muda nada que não estivesse já mudado e infelizmente para pior. A execução de Saddam foi mais um episódio de uma guerra civil larvar que atravessa o Iraque, e é como tal interpretada pelos iraquianos, que a festejaram do lado xiita e que a condenaram do lado sunita, apenas e só nesse contexto.

E é por ter sido mais um episódio da guerra civil que a desaparição física do ditador em nada contribui para a acalmia do país, e muito menos para a democracia. Mostra também como os americanos, em particular, perderam o controlo do processo e têm um dilema crescente: ao passarem o poder para os iraquianos, tem que aceitar uma política interna cada vez mais dominada pelo conflito civil entre xiitas e sunitas, com os curdos a desejarem estar noutro mapa, de preferência com o petróleo a que acham ter direito.

Se não se está de "má fé", então tem que se discutir as alternativas para a coligação após a invasão. Os EUA e os seus aliados sabiam que iam defrontar no Iraque o problema de capturar vivos os principais dirigentes do regime baasista. Não era nada que não tivesse vários precedentes recentes, como o da Alemanha e Japão no fim da II Guerra, ou dos dirigentes sérvios na guerra jugoslava.

O precedente alemão e japonês foi resolvido com tribunais como o de Nuremberga, que acabaram na condenação à morte de muitos altos dignitários nazis, ao exemplo do que aconteceu em muitos outros países da Europa, onde uma vaga de julgamentos ou de decisões extrajudiciais levaram à execução, muitas vezes sumária, de milhares de colaboradores dos alemães.

Se no Iraque fosse seguido o mesmo exemplo, seriam americanos e os outros membros da coligação a julgar Saddam não se sabendo com que base jurídica. Se fosse com base na legislação nacional iraquiana, ou na base da legislação de Nuremberga, Saddam seria quase de certeza condenado também à morte.

Havia a alternativa de o julgar num tribunal como o de Haia, para onde foi enviado Milosevic. Mas o consenso que havia para a Jugoslávia não existia para o Iraque e um tribunal com um apoio internacional dúbio seria sempre visto como um tribunal americano disfarçado. Era provável que neste caso, se o julgamento fosse na Europa, Saddam escapasse com vida, mas ficaria preso até ao fim dos seus dias. Não custa imaginar o clamor que, quer a solução tipo Nuremberga, quer a de um tribunal internacional levantariam, para além de poder reforçar a ideia de uma ocupação estrangeira permanente do Iraque.

Havia uma outra solução, a de levar Saddam para os EUA, como aconteceu com Noriega, mas também aí não seria difícil imaginar o clamor internacional e o impasse jurídico a que se chegaria, pois também na lei americana os crimes de Saddam implicavam a pena de morte.

Apesar de tudo, visto pelo princípio dos "prognósticos só no final do jogo", qualquer destas soluções seria melhor, agora que sabemos o que aconteceu. Mas é preciso entender que os motivos dos americanos, como acontece com algumas das maiores asneiras cometidas no Iraque, resultam de uma mistura de boa vontade ingénua e negligência na análise cuidada dos riscos. Ninguém que quer a democracia pode deixar de admirar a enorme ingenuidade americana, que é o melhor da América, e nalguns caos, o pior.

Vistas as coisas hoje percebem-se as intenções dos EUA: usar o julgamento de Saddam como uma catarse nacional para o Iraque, permitir um módico de justiça (e por muitas críticas que se possam fazer ao julgamento, ele esteve a milhas do que é habitual na região) e oferecer aos iraquianos um ponto zero de partida para a sua democracia. Só os americanos podiam alguma vez pensar nisto a sério, mas não há razão para duvidar das suas intenções, de que, bem sei, está o inferno cheio.

Havia, aliás, uma maneira não americana, nem ingénua de pensar esta questão. Estaline era especialista nessa maneira, que certamente seria muito mais realista e eficaz: a de que "acabando-se com o homem, acabava-se com o problema", mas não me parece que seja esta a alternativa em que alguns críticos do que se passou estejam a pensar. Historiador

O Ministério pimba da Educação

Hoje, no Público, por Desidério Murcho:

"A propósito do livro Desastre no Ensino da Matemática: Recuperar o Tempo Perdido, organizado por Nuno Crato, Edições Gradiva, 2006

s Encontros de Caparide foram uma louvável iniciativa do Ministério da Educação, que pretendia ouvir as sociedades científicas sobre o ensino de algumas disciplinas fundamentais (Português, Matemática, Filosofia) cujas deficiências a nível de currículos são gritantes. Foram tempos áureos, em que um ministro da Educação, David Justino, se preocupava com questões relacionadas com o ensino e não apenas com questões laborais e meramente organizacionais.

O cerne da excelência do ensino é a solidez científica dos currículos e a formação científica dos professores, mas as discussões públicas nacionais sobre educação nunca abordam estes aspectos centrais. Até parece que tudo o resto é que é a finalidade do ensino, quando na verdade são apenas meios.

Dos Encontros de Caparide resultaram dois livros. O primeiro, dedicado à Filosofia (Para a Renovação do Ensino da Filosofia, Plátano), foi publicado no início deste ano. E este volume, dedicado à Matemática, surgiu agora. No primeiro caso, trata-se de discutir uma proposta concreta que visa melhorar a qualidade científica e didáctica dos programas de Filosofia do ensino secundário. No segundo, trata-se de discutir questões pedagógicas gerais que afectam não apenas a disciplina de Matemática, mas todas as outras.

As desastrosas doutrinas pedagógicas que imperam em Portugal, algo pós-modernaças e "construtivistas", são elitistas - apesar de fingirem o contrário - e têm por denominador comum um ódio visceral às Ciências, à Matemática, à História, à Gramática, à Literatura, à Filosofia; enfim, a tudo o que se pareça com verdadeiros conteúdos escolares.

Em vez de conteúdos, fala-se de competências - como se pudesse haver competências sem conteúdos. E em vez de se distinguir cuidadosamente o que são verdadeiros conteúdos escolares do resto, procura-se transformar a escola numa espécie de entretenimento com ademanes de educação para a cidadania - tudo, menos ensinar seriamente Matemática ou Geografia ou Filosofia ou História ou Música. A origem destas ideias remonta a Rousseau e à fantasia do bom selvagem, e o que se visa é acabar com as Ciências, as Artes e as Letras, pois tudo isso corrompe a criança, que é presumivelmente mais feliz a ver televisão e a jogar à bola.

Claro que tudo isto é fantasioso porque para andar a entreter os meninos com conversa fiada não é preciso escola: as crianças divertem-se muito mais fora da escola, e no mundo de hoje não têm sequer tempo para se aborrecer.

Fantasioso é também querer certificar manuais escolares quando os programas das disciplinas, que foram certamente certificados pelo próprio ministério, são o locus classicus do erro científico e do disparate pedagógico. Em muitos casos, para que um manual seja cientificamente bom e pedagogicamente adequado, é obrigado a não respeitar o programa.

Isto porque os programas se degradaram de tal maneira ao longo dos anos que, hoje em dia, ao ler um programa curricular de Filosofia ou Português ou outra disciplina, uma pessoa pergunta-se onde está a Filosofia ou o Português. Os pedagogos ministeriais impuseram ao país a original perspectiva de que se pode ensinar Português sem Português, Filosofia sem Filosofia e Matemática sem Matemática.

Ao mesmo tempo que os estudantes são massacrados com inúmeras disciplinas vácuas sem qualquer centralidade escolar, não têm uma educação básica em Música, nem em Literatura ou Filosofia ou Geografia. Se um estudante de 15 anos quer saber alguma coisa sobre estas coisas, tem de o fazer fora da escola. Mas se quiser brincar aos índios, pode fazê-lo nas chamadas "actividades educativas", em substituição das aulas de Matemática. É esta a educação pimba que temos.

Mas não é esta a educação que a sociedade, no seu todo, quer. Os pais, com maior ou menor formação escolar, queixam-se de que a escola não ensina. Os miúdos cantam, com razão, que "na escola nada se cria, nada se transforma, tudo se perde". Os professores andam há anos a denunciar este estado de coisas.

Mas os pedagogos ministeriais vão passando de governo para governo, conseguindo ora mudar a Gramática toda, prejudicando gravemente a possibilidade da excelência do ensino do Português (se antes poucos professores sabiam e ensinavam Gramática, agora ainda menos - ou será que a ideia é mesmo essa?), ora suspender documentos que introduzem conteúdos científicos sérios num programa que carece deles (como foi o caso da badalada suspensão das Orientações de Leccionação do Programa de Filosofia). A ideia de trabalhar pelo bem do país, pela excelência do ensino, em defesa do interesse público, é alheia a estes originais pedagogos.

Numa cultura como a portuguesa, na qual nunca se valorizou realmente o conhecimento - afinal, no tempo da outra senhora, o conhecimento era um ornamento social para exibir em conversas amenas enquanto se tomava chá -, compete à escola entusiasmar os jovens e a sociedade, dando-lhes uma percepção clara do valor intrínseco do conhecimento.

Mas quando é o próprio ministério da educação que não acredita no valor intrínseco do conhecimento, dificultando cada vez mais o estudo aos muitos professores sérios que temos por esse país fora, afogando-os em trabalho burocrático e em horas contabilizadas nas escolas só para marcar ponto, que se pode esperar do nosso futuro?

Como poderemos recuperar o tempo perdido, tanto no que respeita ao ensino da Matemática como no que respeita às outras disciplinas? Seja qual for a estratégia, o primeiro axioma tem de ser este: o conhecimento tem valor intrínseco, em si e por si, e é do maior interesse público protegê-lo e transmiti-lo, e ensinar a produzi-lo - e só a escola pode fazer isso, ainda que infelizmente o tenha de fazer contra o Ministério pimba da Educação.
Professor de Filosofia